Biossegurança (IV)

abr 08, 2013 | por Sandra Merlo | Microbiologia

African American woman washing handsNo primeiro texto desta série, foram listados alguns micro-organismos a que pacientes e profissionais estão expostos em uma clínica de fonoaudiologia. Os micro-organismos são classificados em escalas de risco: de 1 (baixo risco) a 4 (risco elevado). Os que podem ser transmitidos em um consultório de fonoaudiologia são classificados como classe de risco 2 segundo a Norma Regulamentadora número 32 do Ministério do Trabalho e Emprego (NR nº 32 do MTE):

“Classe de risco 2: risco individual moderado para o trabalhador e com baixa probabilidade de disseminação para a coletividade. Podem causar doenças ao ser humano, para as quais existem meios eficazes de profilaxia ou tratamento”.

Este texto trata principalmente dos cuidados que o fonoaudiólogo deve tomar em sua prática clínica para não ser infectado pelos micro-organismos de classe de risco 2. Além disso, o texto também aborda os resíduos provenientes de um consultório de fonoaudiologia, os quais geralmente são considerados como resíduos comuns, mas também existe a possibilidade de haver resíduos químicos. Para finalizar, listamos a documentação exigida no momento da fiscalização sanitária na cidade de São Paulo e as penalidades para infrações.

 

Corpo e vestuário

Informações importantes sobre a apresentação pessoal visando à biossegurança:

  • As unhas devem ser curtas e sem esmalte colorido. Quanto maior o comprimento, maior a possibilidade de depósito de sujidades debaixo das unhas. O esmalte colorido, por sua vez, dificulta a visão das sujidades debaixo das unhas.
  • Os cabelos devem estar presos.
  • Dar preferência para roupas compridas e sapatos fechados, porque são barreiras mais efetivas de proteção.
  • Joias e adornos são considerados facilitadores de contaminação cruzada (do profissional para o paciente ou vice-versa).

Maiores informações: “Manual de biossegurança” dos Conselhos de Fonoaudiologia.

 

Higienização das mãos

A higienização das mãos é considerada a medida mais simples para o controle de infecções. O contato direto das mãos com objetos infectados (brinquedos, guias de língua, tubos de fonação) pode transmitir micro-organismos como citomegalovírus, estreptococos, influenza, rinovírus, VHA e togavírus.

É fundamental a lavagem das mãos em diversas situações do exercício profissional: no início e no final do turno de trabalho, entre o atendimento de um paciente e outro, após espirrar ou tossir, antes da colocação e após a retirada de luvas. É por isso que a COVISA exige um lavatório na sala de atendimento, embasada no artigo 32.2.4.3 da NR nº 32 do MTE:

“Todo local onde exista possibilidade de exposição ao agente biológico deve ter lavatório exclusivo para higiene das mãos provido de água corrente, sabonete líquido, toalha descartável e lixeira provida de sistema de abertura sem contato manual”.

O tempo total da higienização com água e sabonete é de 40 a 60 segundos (englobando todos os passos: abertura da torneira, aplicação do sabonete, fricção do sabonete, enxague e secagem das mãos). A secagem deve ser feita com toalha descartável. Se o fechamento da torneira não for automático ou por pedal, não se deve tocar diretamente a torneira com a mão, mas com a toalha descartável que foi utilizada.

A higienização com álcool em gel pode ser feita desde que as mãos não estejam visivelmente sujas. Caso contrário, as mãos devem ser lavadas com água e sabonete. O tempo total da higienização com álcool é de 20 a 30 segundos (englobando todos os passos: aplicação do álcool, fricção e secagem natural).

É importante ressaltar que a higienização das mãos com álcool gel não é complemento da higienização com água e sabonete. Ou se utiliza uma ou se utiliza a outra. São procedimentos exclusivos e não complementares.

Atenção para a contaminação do próprio sabonete líquido!

  • Quando o sabonete líquido é do tipo refil, a possibilidade de contaminação é reduzida, porque o refil é descartado quando o produto termina e passa-se a utilizar um refil novo.
  • Quando o frasco do sabonete é reutilizável, o risco de contaminação aumenta, porque o frasco não é substituído quando o sabonete termina, apenas é novamente preenchido. Nesses casos, deve-se lavar o frasco com água e sabão, secar com papel toalha e aplicar álcool 70% para realizar desinfecção de médio nível antes de adicionar novamente sabonete líquido. Não se deve completar o frasco com mais sabonete antes do término do sabonete atual para evitar contaminação.

Maiores informações: manual de “Segurança do paciente em serviços de saúde: limpeza e desinfecção de superfícies” (Anvisa, 2010).

 

Vacinação dos profissionais de saúde

A vacinação contra tétano, difteria e hepatite B é obrigatória a todo trabalhador na área de saúde, segundo a NR nº 32 do MTE.

Para os profissionais de saúde entre 20 e 59 anos, a COVISA indica as seguintes vacinas:

  • Influenza: uma dose por ano.
  • Sarampo, caxumba e rubéola (vacina tríplice viral).
  • Hepatite B: é necessário verificar se houve resposta vacinal com o teste laboratorial Anti-HBs.
  • Difteria e tétano (vacina dupla tipo adulto): uma dose a cada dez anos na vida adulta.
  • Febre amarela: uma dose a cada dez anos na vida adulta.

Uma série de outras vacinas também devem ter sido tomadas na infância: BCG (tuberculose), tríplice (difteria, tétano e coqueluche), tríplice viral (sarampo, caxumba, rubéola), catapora/varicela, hepatites A e B, varíola, pneumococo.

Na fiscalização feita pela COVISA na cidade de São Paulo, é obrigatória a apresentação da carteira de vacinação atualizada dos profissionais que trabalham no consultório de fonoaudiologia (não apenas dos fonoaudiólogos, mas de todos os profissionais).

Maiores informações: calendário vacinal da COVISA e “Manual de biossegurança” dos Conselhos de Fonoaudiologia.

 

Equipamentos de proteção individual (EPI)

O documento oficial que regula o uso dos EPIs é a Norma Regulamentadora número 6 do Ministério do Trabalho e Emprego (NR nº 6 do MTE), a qual foi publicada no Diário Oficial da União em 1978 (D.O.U. 06/07/78) e sofreu diversas alterações e complementações ao longo dos anos. O texto atualizado pode ser lido aqui.

“Equipamento de proteção individual” é todo produto de uso individual que tem a função de proteger a saúde e a segurança do trabalhador. A lista completa de EPIs é a seguinte:

  1. Para proteção da cabeça: capacetes e capuzes.
  2. Para proteção dos olhos e face: óculos, protetores faciais e máscara de solda.
  3. Para proteção auditiva: protetores auditivos.
  4. Para proteção respiratória: respiradores purificadores de ar e respiradores de adução de ar.
  5. Para proteção do tronco: vestimentas diversas e colete à prova de balas.
  6. Para proteção dos membros superiores: luvas, creme protetor, mangas, braçadeiras e dedeiras.
  7. Para proteção dos membros inferiores: calçados, meias, perneiras e calças.
  8. Para proteção do corpo inteiro: macacão e vestimentas.
  9. Para proteção contra quedas: dispositivo trava-queda e cinturão.

A seleção do EPI depende do procedimento que será executado.

O empregador é obrigado a fornecer aos empregados os EPIs adequados ao trabalho que será executado, além de orientá-los sobre a maneira correta de utilizá-los. Os empregados, por outro lado, são obrigados a utilizar os EPIs nas finalidades a que se destinam (e apenas nelas).

No Brasil, para um EPI ser vendido ele necessariamente precisa ter o Certificado de Aprovação do MTE.

O documento oficial que regula a segurança no trabalho em serviços de saúde é a NR nº 32 do MTE, a qual foi publicada no Diário Oficial da União em 2005 (D.O.U. 16/11/05) e sofreu alterações e complementações ao longo dos anos. O texto atualizado pode ser lido aqui.

Na fonoaudiologia clínica, os EPIs mais habituais são: protetor facial (máscara), vestimenta (avental) e luvas.

  • A máscara é uma barreira para as vias áreas superiores. A troca deve ser feita após cada atendimento.
  • A finalidade do avental é ser uma barreira adicional à vestimenta do profissional. A cor deve ser clara, com mangas compridas e decote alto. A troca deve ser realizada quando o avental estiver visivelmente sujo. Após a retirada, o avental deve ser transportado pelo avesso e em saco plástico.
  • A luva é uma barreira para as mãos do profissional. Para avaliação ou terapia, podem ser usadas luvas de procedimento não estéreis. A troca deve ser feita após cada atendimento. Deve ser feita lavagem das mãos antes e depois do uso das luvas.

Esses EPIs devem ser utilizados durante exames da musculatura facial e intraoral e durante exames auditivos para proteger o profissional contra secreções (nasais, bucais, auditivas). Em outras situações, estão dispensados. É proibido o uso dos EPIs fora do local de trabalho.

 

Resíduos

Os serviços de saúde são responsáveis pelo gerenciamento correto de todos os resíduos por eles gerados. Isso é válido para os serviços públicos e privados, para saúde humana e animal, para atendimento no próprio serviço e domiciliar.

Existem cinco grupos de resíduos:

Grupo A – risco biológico: resíduos de saúde que podem apresentar risco de infecção. Exemplos: culturas de micro-organismos, vacinas, bolsas com sangue contaminado ou com prazo de validade expirado, peças anatômicas humanas ou de animais, tecido adiposo proveniente de lipoaspiração, etc. Esses resíduos devem ser acondicionados em sacos com símbolo de substância infectante. Os sacos podem ser na cor branco leitoso ou vermelho (dependendo do conteúdo).

Grupo B – risco químico: resíduos químicos de saúde que podem representar risco à saúde pública ou ao meio ambiente devido às características de inflamabilidade, corrosividade, reatividade e/ou toxicidade. Exemplos: produtos hormonais e antimicrobianos, medicamentos antineoplásicos ou antirretrovirais, saneantes e desinfetantes. Esses resíduos são acondicionados em sacos (se sólidos) ou em outros recipientes (se líquidos) com o símbolo do risco químico mais apropriado.

Grupo C – risco radioativo: resíduos de saúde que representam risco à saúde pública ou ao meio ambiente. Exemplos: resíduos de medicina nuclear ou de radioterapia. Esses resíduos são acondicionados em sacos amarelos com símbolo de radiação ionizante e a inscrição “Rejeito radioativo”.

Grupo D – resíduo comum: resíduos de saúde que não apresentam risco biológico, químico ou radiativo. Exemplos: material utilizado em assepsia, luvas, máscaras, equipo de soro, resíduos de gesso, etc. Esses resíduos devem ser acondicionados em sacos plásticos pretos.

Grupo E – risco biológico: resíduos de saúde que podem apresentar risco de infecção e que são perfurocortantes. Exemplos: lâminas de barbear, agulhas, ampolas de vidro, lâminas de bisturi, etc. Esses resíduos são acondicionados em recipientes resistentes (geralmente de papelão) com o símbolo de substância infectante e a inscrição “Resíduo perfurocortante”.

A simbologia dos riscos é regulamentada no Brasil pela NBR 7.500 da ABNT (ver páginas 10-16).

Quando o consultório fonoaudiológico realiza desinfecção química de alto nível com glutaraldeído, a primeira opção é fazer a neutralização do saneante para posterior descarte na rede de esgoto. Se isso não for feito, devem-se considerar o resíduo líquido de glutaraldeído como Grupo B, porque é um saneante que apresenta risco à saúde e ao meio ambiente. O resíduo líquido deve ser acondicionado em um recipiente resistente e de material compatível com a formulação química (neste caso, pode ser plástico) e que possua tampa com rosca. Na cidade de São Paulo, a empresa que faz a coleta de resíduos de serviços de saúde é a Loga. Maiores informações sobre cadastramento do serviço de saúde, pagamento da taxa de coleta e documentos necessários para a entrega do resíduo, aqui.

Entretanto, os resíduos de saúde produzidos em um consultório de fonoaudiologia geralmente são considerados como sendo do Grupo D, ou seja, comuns: luvas, máscaras, espátulas, espéculos, moldes auriculares, tubos de fonação, protetores de microfone e fone de ouvido, resíduos provenientes de atividades administrativas. Desta forma, não são resíduos que necessitam de tratamento ou coleta especial.

No serviço de saúde, os sacos de resíduos sólidos devem estar contidos em recipientes (lixeiras) de material lavável, com cantos arredondados e com a abertura da tampa feita sem contato manual. Os resíduos sólidos devem ser acondicionados em sacos impermeáveis e resistentes, respeitando-se os limites de peso dos sacos. Os sacos com os resíduos não devem estar totalmente cheios (encher até 2/3 da sua capacidade) para que os resíduos não transbordem e para que o saco não rasgue. A troca deve ser feita quando os sacos chegarem a 2/3 de sua capacidade ou a cada 24 horas. Além disso, os sacos devem ser fechados adequadamente para que, mesmo se virados para baixo, não permitam o derramamento do seu conteúdo.

Maiores informações: Resolução de Diretoria Colegiada (RDC) nº 306 de 2004 da Anvisa.

 

Manual de rotinas e procedimentos

É um documento escrito que especifica todos os processos de trabalho realizados no estabelecimento:

  • Quais são as atividades profissionais (anamnese, avaliação, aconselhamento e/ou terapia) e como são realizadas (métodos objetivos e/ou subjetivos, uso de aparelhos, etc.);
  • Quais são os processos de limpeza, desinfecção e esterilização de artigos;
  • Quais são os processos de limpeza e desinfecção de superfícies.

Este documento é solicitado pela COVISA no momento da inspeção do consultório.

 

Fiscalização sanitária

No ato da fiscalização pela COVISA, diversos documentos são exigidos:

  1. Comprovante de inscrição do responsável técnico no Conselho Regional de Fonoaudiologia;
  2. Manual de rotinas e procedimentos;
  3. Controle de manutenção dos equipamentos (equipamentos audiológicos, ar condicionado e autoclave, por exemplo);
  4. Carteira de vacinação dos funcionários;
  5. Contrato dos serviços terceirizados (faxina, por exemplo);
  6. Certificado de controle de pragas urbanas e da limpeza da caixa d’água;
  7. Auto de vistoria do Corpo de Bombeiros;
  8. Se pessoa jurídica, contrato social e registro do consultório no Conselho Regional de Fonoaudiologia.

Caso os documentos não sejam apresentados no ato da vistoria, os responsáveis têm até 15 dias para apresentá-los. Se isso não for feito, o estabelecimento fica impedido de funcionar.

Maiores informações: Guia da COVISA.

 

Infrações e penalidades sanitárias

O não cumprimento das exigências sanitárias expõe o consultório a diversas penalidades. Na cidade de São Paulo, a legislação é constituída por:

  1. Código Sanitário da cidade de São Paulo: lei nº 13.725 de 2004.
  2. Código Sanitário do estado de São Paulo: lei nº 10.083 de 1998.
  3. Código de Saúde: lei complementar nº 791 de 1995.
  4. Código de Defesa do Consumidor: lei nº 8.078 de 1990.
  5. Leis orgânicas da saúde nº 8.080 e 8.142 de 1990.
  6. Constituição do Brasil de 1988.

Seguindo a temática desta série, são exemplos de infrações sanitárias em um consultório de fonoaudiologia:

As penalidades incluem intervenção, multa e/ou interdição do consultório.

Maiores informações: “Código Sanitário: infrações e penalidades” (COVISA, SP, 2004).