Eletroterapia e seus cuidados

jun 09, 2014 | por Sandra Merlo | Eletroterapia, Gagueira

risco elétrico-2Neste último texto da série, falaremos sobre como evitar acidentes durante a eletroterapia não invasiva.

 

Contraindicações

Não é qualquer paciente que pode receber eletroterapia. As contraindicações são as seguintes [1, 2]:

  • Lesões de pele na área de aplicação da eletroterapia. Os eletrodos de superfície somente deverão ser fixados em regiões de pele íntegra; a pele entre os eletrodos também deve estar íntegra. Um corte, por exemplo, vai diminuir a resistência da pele naquela região e facilitar a concentração de corrente elétrica, aumentando a probabilidade de queimadura.
  • Sensibilidade prejudicada da pele na região de aplicação da eletroterapia. Neste caso, o paciente não será capaz de perceber e referir com clareza o efeito da corrente elétrica, o que aumenta a probabilidade de lesão de pele ou muscular.
  • Musculatura a ser estimulada já está fadigada.
  • Aplicação na região do cérebro.
  • Suspeita ou diagnóstico de epilepsia.
  • Aplicação na região do tórax, porque a corrente elétrica pode interferir no ritmo cardíaco.
  • Suspeita ou diagnóstico de problemas cardíacos.
  • Aplicação em regiões que possam interferir com o funcionamento de marca-passo cardíaco ou cerebral (como face e pescoço).
  • Aplicação na região abdominal de mulheres com suspeita ou confirmação de gravidez.
  • Paciente apresenta alguma infecção. Neste caso, a corrente elétrica pode aumentar a atividade metabólica e agravar o quadro. No caso da fonoaudiologia, atenção especial para infecções de vias aéreas superiores.
  • Presença de metal na região de aplicação requer corrente bifásica e balanceada. No caso da fonoaudiologia, atenção para implantes dentários e aparelhos ortodônticos.
  • Suspeita ou diagnóstico de tumor na região de aplicação da eletroterapia. A aplicação de corrente elétrica pode aumentar a atividade metabólica na região e agravar o quadro.
  • Suspeita ou diagnóstico de trombose venosa na região de aplicação da eletroterapia. A aplicação de corrente elétrica pode provocar o deslocamento do trombo.
  • Existência de fragilidade óssea na região de aplicação da eletroterapia, porque as contrações musculares poderão agravar o quadro.

Em princípio, a aplicação na região do seio carotídeo também é contraindicada. O seio carotídeo está localizado na região anterior do pescoço, na bifurcação da artéria carótida comum em carótida interna e externa. É um receptor que detecta pressão arterial e frequência cardíaca e envia essas informações ao tronco encefálico. A aplicação de eletroterapia na região anterior do pescoço pode interferir no funcionamento do seio carotídeo, acarretando redução da pressão arterial e dos batimentos cardíacos. Entretanto, nos textos anteriores desta série, foram relatados estudos em voz e fluência em que foi aplicada eletroterapia na região anterior do pescoço, sem qualquer referência à hipotensão ou síncope. A recomendação do fonoaudiólogo Bruno Guimarães, que utiliza eletroterapia desde 1986, é a medição da pressão arterial antes, durante e após a aplicação de eletroterapia. Se o paciente apresentar redução de pressão arterial ou dos batimentos cardíacos com o procedimento, a eletroterapia não está indicada.

 

Termo de consentimento

Quando a eletroterapia é considerada um procedimento útil, o paciente deve ser esclarecido quanto à sua aplicação. O paciente não deve se submeter ao procedimento se não estiver seguro quanto aos benefícios e riscos. Se o paciente consentir com o procedimento e se não houver qualquer contraindicação, a eletroterapia pode ser aplicada. O profissional pode solicitar que o paciente ou seu responsável assine um termo de consentimento, no qual afirma desejar o procedimento e afirma não apresentar nenhuma contraindicação.

 

Queimaduras

Queimaduras poderão ocorrer quando a intensidade da corrente elétrica for excessiva. Cuidados em relação a este aspecto incluem [3, 4]:

  • Limpar adequadamente a pele em que os eletrodos de superfície serão fixados. A limpeza adequada reduz a impedância da pele através da remoção de gordura e sujidades. A redução da impedância favorecerá para que a intensidade da corrente utilizada seja menor.
  • Fixar adequadamente os eletrodos na pele. Existem diversos motivos que fazem com que os eletrodos não sejam fixados adequadamente: a pele não foi suficientemente limpa, o eletrodo em si não foi suficientemente fixado (ou porque não foi feita pressão suficiente, no caso de eletrodo autoadesivo, ou porque não foi utilizada fita adesiva suficiente, no caso de eletrodo comum), o eletrodo já ultrapassou seu tempo de vida útil. A má fixação do eletrodo faz com que a densidade da corrente aumente nas regiões em que há adesão à pele, o que aumenta o risco de queimaduras nessas regiões.
  • O tempo de aplicação da eletroterapia não deve ser excessivo. Recomenda-se iniciar com períodos curtos de aplicação (5-10 minutos) e verificar a pele após esse período.
  • O risco de queimadura é maior com corrente contínua e com corrente alternada desbalanceada.
  • A intensidade de corrente não deve ser excessiva. Para isso, é necessário que o paciente informe a intensidade confortável de estimulação.
  • É preciso respeitar a densidade máxima de corrente suportada por cada eletrodo. Lembrar que a intensidade máxima não deve ultrapassar 2mA/cm2 de área total do eletrodo para correntes alternadas e pulsadas balanceadas e 0,2mA/cm2 para correntes contínuas e correntes alternadas desbalanceadas.

 

Aparelho de eletroterapia

O profissional de saúde deve ler na íntegra o manual de instruções e estar familiarizado com o funcionamento do aparelho [3, 4].

A maioria dos aparelhos de eletroterapia não invasiva gera corrente elétrica de baixa intensidade (na ordem de μA ou mA). Além disso, a frequência de estimulação também costuma ser baixa, sendo que a pele apresenta alta impedância para correntes de baixa frequência [3]. Essas características por si só diminuem o risco de queimaduras.

Os aparelhos de eletroterapia não invasiva são especialmente projetados para não originar choque elétrico [3, 4]. Por lei, um estabelecimento de saúde pode adquirir e utilizar somente aparelhos com registro na Anvisa.

Os eletrodos utilizados devem sempre estar em bom estado. Os cabos utilizados também devem estar em bom estado: qualquer dano no cabo indica que deve ser substituído. O aparelho de eletroterapia deve receber manutenção conforme especifica o manual de instruções do fabricante [3, 4]. A manutenção deve ser feita por um engenheiro elétrico, o qual deve emitir um laudo por escrito. O laudo deve ser guardado e apresentado à Vigilância Sanitária em caso de inspeção no estabelecimento de saúde.

Os aparelhos de eletroterapia geralmente possuem fusíveis, que são dispositivos elétricos que interrompem a passagem de corrente quando ocorre curto-circuito ou sobrecarga elétrica.

 

Conexão e desconexão

O cabo de força e os cabos que serão conectados aos eletrodos devem estar bem posicionados, sem possibilidade de mau contato [3, 4].

O aparelho deve ser ligado e deve estar com intensidade zerada antes de o paciente ser conectado a ele [3, 4].

Durante a estimulação, a intensidade deve ser regulada gradativamente [3, 4]. Observar e questionar o paciente sobre os efeitos da estimulação.

Após a estimulação, a intensidade deve ser zerada. O paciente deve ser desconectado do aparelho. Só então o aparelho pode ser desligado [3, 4].

Principalmente quando o aparelho estiver em uso, recipientes com líquidos devem ser afastados [4]. Verificar se o equipamento possui proteção contra entrada de líquidos. Essa especificação vem com a sigla “IPX” (“International Protection Rating”). Se após a sigla IPX vier o número zero (IPX0), significa que o aparelho não contém nenhuma proteção contra água. Se após a sigla IPX vier um número entre um e oito, significa graus variados de proteção contra água.

 

Rede elétrica

A rede elétrica do estabelecimento de saúde deve contar com disjuntores que, assim como os fusíveis, interrompem a passagem de corrente quando ocorre curto-circuito ou sobrecarga elétrica [4].

 

Choque elétrico

Com a observação das rotinas de segurança expostas anteriormente, o risco de choque elétrico torna-se mínimo.

Quando o choque for causado por correntes de 1mA, ocorrerá apenas sensação de formigamento. Quando o choque for causado por correntes de 16mA, ocorrerá contração muscular intensa. Quando o choque for causado por correntes de 80mA, ocorrerá fibrilação ventricular [4].

Qualquer ocorrência de choque elétrico, por menor que seja, exige a inspeção do aparelho de eletroterapia e da rede elétrica do estabelecimento de saúde [4].

 

Eventos adversos e queixas técnicas

Eventos adversos e queixas técnicas devem ser comunicados ao Sistema de Notificações em Vigilância Sanitária (NOTIVISA) da Anvisa.

 

 

Referências

[1] Schuhfried, O. et al. (2012). Non-invasive neuromuscular electrical stimulation in patients with central nervous system lesions: An educational review. Journal of Rehabilitation Medicine, 44(2), 99-105.

[2] Araújo, K. G. et al. (2006). Indicações e contra-indicações para o uso da eletroterapia. In: Cisneros, L. L. & Salgado, A. H. I. Guia de eletroterapia (pp. 89-92). Belo Horizonte: Coopmed Editora Médica.

[3] Cisneros, L. L. et al. (2006). Como evitar acidentes na terapia com corrente elétrica. In: Cisneros, L. L. & Salgado, A. H. I. Guia de eletroterapia (pp. 93-96). Belo Horizonte: Coopmed Editora Médica.

[4] Robinson, A. J. (2010). Instrumentação para eletroterapia. In: Robinson, A. J. & Snyder-Mackler, L. Eletrofisiologia clínica: eletroterapia e teste eletrofisiológico (pp. 41-83). 3ª ed. Porto Alegre: Artmed.